A vida de quem trabalha com a morte

Mais de 1000 mortes por dia na pandemia. Quem enterra essas vidas? Confira a série dos coveiros no SP Invisível.

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A vida de quem trabalha com a morte

Em nosso livro “A Pandemia Que Ninguém Vê”, estamos contando histórias dos invisíveis da pandemia. Cidadãos de rua que não tem casa para ficar, catadores de materiais recicláveis que tiveram sua renda diminuída devido aos restaurantes e bares fechados, entregadores de comida que se expuseram ao vírus desde o início da pandemia para garantir a alimentação de quem ficou em casa e também os coveiros, profissionais que atuam diariamente com a morte e que são pouco falados, invisíveis na cidade.

Enquanto escrevo, hoje no Brasil temos em média 1223 mortes por dia devido ao Corona vírus, de acordo com os dados oficiais da OMS. Com certeza, um dos grupos que mais estão trabalhando hoje em dia são os profissionais que trabalham nos cemitérios. Todos os dias, eles lidam com tristezas, despedidas, lágrimas e tem que fazer isso numa escala bem maior do que nos últimos anos. Em entrevista para o SP Invisível, o sepultador Paulo Henrique disse:

A gente tem que ter medo dos vivos, não dos mortos. Eu gosto do trabalho, mas o sofrimento é o mais difícil… A gente vê o sofrimento de uma mãe e fica meio pensativo, tentando não levar pro lado pessoal, não subir pra cabeça.

O SP Invisível passou vários dias no cemitério da Vila Formosa ouvindo os profissionais de várias áreas de um cemitério para mostrar, tanto nas redes sociais, quanto em nosso livro “A Pandemia Que Ninguém Vê”, a vida de quem trabalha com a morte. Quais são os sonhos dessas pessoas e quais são as suas histórias? Aqui você pode ler alguns relatos da nossa série “Sepultadores Invisíveis”. Caso queira ler outros, siga a gente no instagram e compre nosso livro.

Não realizei sonho nenhum, nunca tive casa própria, carro, nada. Só comi e vivi. Com os 997 reais que ganho, não tem como fazer financiamento.

Na pandemia trabalhei todos os dias. Aliás, nunca faltei! Aqui não mudou muito, não, até diminuiu. É um cemitério de classe média, né? Podem se cuidar…

Uma pessoa dessa região pode ficar em casa. A da Vila Formosa fica como? Vai passar fome?

“Ah, o governo deu 600 reais”

Quem vive com 600 reais? O pobre pega o vírus e morre! Aqui ninguém pegou. Ainda bem, né? Fora isso, só falta o governo olhar o salário. O meu holerite é a mesma coisa há 15 anos. Nosso salário é uma vergonha!

Tem família aqui que gasta 30 mil num sepultamento, 50 mil. O mundo é assim, uns têm muito e outros têm pouco…

Vizinho meu passa fome. Agora o vereador ganha 30 mil reais, tem auxílio disso, daquilo, e eu não tenho nada. E se quebra a previdência, a culpa é nossa!

Se tive medo? Nenhum. Na TV falam que, quem trabalha em serviço essencial, tem que arrumar lugar pra ficar. A gente “malemá” paga as contas. Fácil falar, quero ver viver nossa vida…”

Reginaldo de Oliveira, sepultador, 50 anos

“Certa vez, tava descendo o caixão e não tinha reparado quem era a família. Terminando de descer, alguém bateu nas minhas costas e falou: “Vai devagar, que você tá enterrando a tia, aí”.

Fiquei paralisado, fui para um canto e comecei a chorar…

Outro momento foi quando enterrei meu pai. A gente convivia aqui diariamente, ele era jardineiro. Mais de 23 anos trabalhando juntos, escutando, dando força um para o outro. Era um amor incondicional!

Foi um baque muito grande… É uma pessoa que amo muito e fica marcado, faz muita falta. Era meu herói.

Até hoje tomo remédio pra depressão e, honestamente, não me recuperei. Na pandemia chegamos a fazer quase 90 sepultamentos todos os dias.

É assustador, mesmo usando todos os equipamentos. Enterramos da sete da manhã às oito da noite. Foi porreta.

Nesse tempo teve um senhor que me marcou. A gente perguntou:

– Você de novo aqui?

Ele respondeu:

– Enterrei semana passada minha mãe, agora meu tio e devo voltar semana que vem pra enterrar outro tio, que tá na UTI…

Adenilson Costa, sepultador, 49 anos

Quer ler mais histórias? Compre nosso livro “A Pandemia Que Ninguém Vê” e leve essas histórias para casa e ainda ajude o SP Invisível a continuar humanizando os olhares e conscientizando a sociedade sobre os invisíveis de São Paulo.

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